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22 de novembro de 2015
Por Marcelo Almeida*


Carlos Alberto e Chico de Neco Carteiro
O escritor areia-branquense Chico de Neco Carteiro, a quem, no mundo literário, insistem em chamar de Francisco Rodrigues da Costa, lançou, na última terça-feira, 17/11/2015, na Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, Guanabara, sua mais recente obra. Chico, naquela noite, exalava alegria, devido ao contato com grandes amigos que haviam ido prestigiá-lo e, principalmente, matar a curiosidade sobre o conteúdo do novo livro. De fato, Rodrigues já cravou alicerces no universo literário potiguar. A cada trabalho, há um novo frenesi de leitores fiéis, sobretudo os areia-branquenses.

Tendo começado na Literatura como cronista, focando-se no memorialismo do mundo areia-branquense, ele agora se aventura pelos romances. Este é o seu segundo. O primeiro foi Perdão. Mas, não deixou cair no esquecimento os traços iniciais. Seus textos são recheados de memória. É uma literatura de romances memorialistas, ou de memorialismos romanceados. Em Guanabara, Chico despeja, em 180 páginas, os dramas de sua vida. Conta sua história de amor com a falecida esposa Zezinha, e o sofrimento com a doença e o falecimento de suas duas filhas. É uma história de vida e de morte. Contudo, ele não se desfez da leveza de sua narrativa, tampouco esqueceu Areia Branca, presença constante em sua obra. Tal qual no universo real, na dimensão literária, Rodrigues jamais perdeu a ternura e a poesia. Certamente, esse romance seria trágico, se não fosse terno e poético.

Para homenagear a Chico, em razão de sua literatura encantadora, como escritor que não esquece, jamais, Areia Branca, e também para brindar aos fiéis leitores, transcrevo, a seguir, um recorte de Guanabara. É uma crônica memorialista, inserida no romance.


“[…] O Silêncio de Daniela

Muitas vezes, acompanhei Telé à salina Monteprimo, a ele arrendada, para ver o andamento dos serviços contratados. Sempre visitávamos a casinha do motor. Ali, foi instalada uma bomba de sucção. Meados da década de sessenta, os moinhos de vento já estavam em desuso. O encarregado da estação captadora de água geralmente dormia tranquilamente, apesar da barulheira infernal que o mecanismo fazia. Certa vez perguntei como ele conseguia tal façanha.

– Desperto de supetão quando o motor pára. – foi a resposta.

Eu lembrava aquele diálogo de quarenta e cinco anos passados, justamente a idade de Daniela, quando olhava o seu corpo já sem vida. Mergulhado em pensamentos, eu rezava pelo descanso de sua alma. Eram as primeiras horas do dia nove de agosto, e, na capelinha de Nossa Senhora do Perpetuo Socorro, acontecia o velório de minha filha, cujo óbito se dera no final da tarde do sábado recém findo.

Minha mente, naquela hora, se enchia de lembranças, como se eu pudesse mudar o destino traçado por Deus: nesses últimos cinco anos, após a retirada, com sucesso, de um nódulo na hipófise, tudo fazia crer que vencêramos a guerra contra o inimigo. Muitos detalhes foram passados. Quantas viagens, Jesus, fiz com Daniela a Fortaleza. Algumas para simples visitas médicas. Outras tantas, quando sua saúde complicava, para internamento hospitalar. E, inúmeras vezes, quase desesperado, reclamei contra aquela espécie de castigo que desabava sobre mim. Mas, logo, encontrava consolo para minha queixa destituída de fé: ‘Deus só entrega uma cruz a quem suporta carregá-la’. Refeito, tomava o lenho, continuando a caminhada.

Hoje, quinze dias que Daniela não vive mais comigo, algumas pessoas ainda me consolam: ‘Deus reservou para sua filha um lugar livre de sofrimentos’.

Ainda bastante saudoso pela falta de minha filha, decido me deslocar até Areia Branca no dia 15 de agosto. Na cabeça de qualquer areia-branquense é difícil não latejar, nesse dia, a lembrança da procissão marítima, dedicada à Virgem dos Navegantes. Acompanhado por Zélia, minha irmã, Néo, meu genro, Rodrigues e Rachel, meus netos, me mando para lá, buscando lenitivo.

Ao alcançar as imediações da praia de Upanema, o cheiro da maresia começa a me retemperar. Esse odor me leva ao passado, em saudosas e alegres recordações. Prefiro sempre a Travessa dos Calafates para chegar ao centro da cidade. Tomo a Rua Coronel Liberalino e alcanço a pracinha da igreja.

Do seu patamar, apreciava o movimento na maré. Aquele cenário me fez recordar o ano de 1982, quando levei Daniela para a festa de agosto.

Em meio ao turbilhão de imagens e sentimentos, lembrei do operário que acordava de súbito com a parada do motor. Naquele instante, apossou-se de mim a dor da saudade, era o silêncio de Daniela […]”


(*) Marcelo Almeida é médico-anestesiologista e escritor (contista e cronista). É areia-branquense, mas reside em Brasília/DF. Atualmente vem colaborando com o Blog Era Uma Vez em Areia Branca, coordenado por Carlos Alberto, areia-branquense doutor em Física.
Para ler mais contos e crônicas de Marcelo, clique [AQUI].


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