12 de junho de 2017
O Ministério Público Federal
(MPF) no Rio Grande do Norte emitiu um parecer favorável à transferência do
ex-presidente da Câmara Federal Henrique Eduardo Alves para Brasília, conforme
solicitado pelo juiz da 10ª Vara Federal do Distrito Federal. No entender do
MPF, a custódia de presos em quartéis (ele se encontra custodiado na Academia
de Polícia da PM/RN) somente deve ser adotada “quando inexistir outra unidade
que possa cumprir as exigências legais”.
No caso de Henrique Alves, o
parecer reforça que “a unidade prisional de Brasília é, dentre as duas opções
possíveis, a mais indicada a garantir os direitos e deveres do preso”,
lembrando que os relatos quanto às atuais condições de custódia do também
ex-ministro apontam sua permanência em sala com ar-condicionado, acesso a
mídias proibidas e visitas permanentes, “além de outras regalias incompatíveis
com o regime de prisão cautelar”.
O parecer destaca que
manifestações anteriores do Comando da Polícia Militar do RN já deram conta de
que os quarteis não apresentam as condições adequadas à custódia de presos
civis. Na Academia da PM não há sequer fornecimento de alimentação a
custodiados. “Ele, então, pelo menos pelo que se noticia, tem solicitado
refeições em restaurantes de Natal, o que configura regalia inconcebível para
uma pessoa submetida à prisão preventiva”, reforça o parecer.
O MPF também questiona a ausência
de um controle rigoroso sobre visitas e contatos, “fato que destoa da própria
finalidade da custódia cautelar, que é o de cortar vínculos do preso com o meio
político e empresarial criminoso em que vivia”. Nessas circunstâncias, avalia
que é “plenamente razoável” a transferência para Brasília, onde há um sistema
penitenciário melhor preparado para recebê-lo.
“De resto, lá já tramita ação
penal contra ele, com a realização de audiências às quais inclusive ele
ressaltou, em audiência de custódia, que fez questão de comparecer
pessoalmente”, acrescentam os representantes do MPF.
Argumentos - O MPF cita diversas
jurisprudências ressaltando que o direito do preso de permanecer próximo à sua
família não se trata de algo absoluto, podendo ceder diante de necessidades da
administração penitenciária, como no caso de Henrique Alves. “Quanto à alegação
de que a transferência traria custos ao Estado, trata-se de argumento curioso,
em especial quando parte de quem é investigado – e até mesmo já acusado –
exatamente, por desviar recursos e receber milhões de reais em propina.”
O parecer lembra ainda que o
próprio Henrique Alves, em meados de 2013, “não viu prejuízo algum ao erário na
utilização de avião da Força Aérea Brasileira para transportar a ele e à sua
família para um jogo da Seleção Brasileira no Rio de Janeiro” e conclui que a
atual situação é “ilustrativa do prejuízo concreto que anos de descaso com o
sistema prisional do próprio Estado de origem, por parte de políticos, podem
causar em desfavor deles próprios, em algum dia futuro”.
Histórico - Os pedidos de prisão
preventiva de Henrique Alves e Eduardo Cunha (que já se encontrava preso no
Paraná) foram cumpridos pela Polícia Federal no último dia 6 de junho, dentro
da Operação Manus. Os dois foram acusados de receber propina em troca do favorecimento
de empreiteiras. Na mesma data, foram expedidos mandados de prisão preventiva
contra os mesmos envolvidos, pela 10ª Vara Federal do Distrito Federal, dentro
das operações Cui Bono e Sepsis.
O MPF relata que, no dia da
prisão, na audiência de custódia, Henrique Alves “apresentou certidão da OAB/RN
segundo a qual ostentaria a condição de advogado. O órgão ministerial estranhou
o fato, pois consulta realizada ao Cadastro Nacional de Advogados – CNA da OAB
não apontava nenhum registro de Henrique Eduardo Lyra Alves”.
A OAB/RN esclareceu que Henrique
Alves é, de fato, advogado, mas se encontrava em atraso quanto ao pagamento da
anuidade, somente vindo a quitar a dívida no último dia 7, já após se encontrar
preso. “O pagamento em atraso objetivou apenas assegurar-lhe a condição
meramente formal de advogado – já que Henrique Eduardo Lyra Alves na realidade
nunca advogou – e o direito à prisão especial prevista no art. 6º, inciso V, da
Lei n. 8.906/1994”, observa o parecer.
Cela especial - No mesmo dia 7 de
junho, o Ministério Público Federal expediu ofício à Secretaria de Justiça e
Cidadania do RN requisitando, com urgência, informações sobre a existência de
celas capazes de receber advogados presos no sistema penitenciário potiguar.
Porém, até a elaboração do parecer não havia sido enviada qualquer resposta.
Entretanto, um pedido formulado
por outro investigado preso na operação, Carlos Frederico Queiroz, obteve como
resposta a informação de que, em razão da situação caótica do sistema prisional
do Rio Grande do Norte, com vários episódios de rebelião e destruição, “não
existem unidades com celas para presos com formação de nível superior”.
Diante da falta de estrutura, no
Rio Grande do Norte os presos com diploma de curso superior e advogados estão
sendo custodiados em quartéis da Polícia Militar. “No entanto, essa solução
deve ser adotada apenas como última opção, somente se for estritamente
necessária, não havendo alternativa. Isso porque tais unidades não foram
concebidas para abrigar presos”, indica o MPF.
Caso anterior – Em outra ação
penal (0003785-23.2014.4.05.8400), após deferido o pedido de prisão especial
dos réus - cinco sírios presos no aeroporto de Natal -, o Comando Geral de
Polícia Militar do RN, com fundamento em recomendação do Ministério Público
Estadual, afirmou que aquela unidade policial não detinha estrutura física nem
de pessoal para guarnecer presos.
Um trecho do ofício da PM destaca
que “(...) no nosso entendimento, em momento algum houve assertiva de que
existissem condições de pessoal ou estrutural de receber os mesmos presos nas
dependências do QCG. (...) Além de todos os argumentos supra destacados, vimos
ainda informar que esse QCG não dispõe de alimentação (rancho), já que
naturalmente os presos deverão ser alimentados onde quer que sejam, o que
traria outro problema de ordem logística da PMRN”.
Em outro trecho, a Polícia
Militar acrescenta: “Ressaltamos ainda que inexiste, no ordenamento jurídico
brasileiro, qualquer dispositivo que possibilite ao preso civil permanecer
custodiado em Quarteis Militares, uma vez que fere a Constituição Federal –
sobretudo o art. 37 e 144 § 5º -, implicando em desvio de função das atividades
constitucionais inerentes aos policiais militares”. Diante desses argumentos, a
Justiça Federal acolheu a manifestação do Comando da PM e negou a transferência
dos réus para aquela unidade.
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